O 'garotão' que levou a Delta à esfera nacional
Jeito de garotão, simpatia de carioca e leve sotaque que
denuncia o nascimento em Pernambuco. O empresário Fernando Cavendish mistura
comportamento informal nos contatos pessoais com agressividade peculiar nos
negócios. O estilo do dono da Delta Construções, brindado com muitas das obras
do governo do Rio e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), confunde-se
com a ascensão da empresa que, de modesta visibilidade em Pernambuco, em 15 anos
galgou posto de destaque no País.
O bom relacionamento com sucessivos governos fluminenses -
Anthony Garotinho (1999-2002), Rosinha Garotinho (2003-2006) e Sérgio Cabral
Filho (a partir de 2007) - foi importante na trajetória, agora sob investigação
da Polícia Federal e da CPI do Cachoeira.
Até os anos 1990, porém, a Delta e Cavendish viveram
trajetórias distintas. A empresa foi fundada em Recife, em 1961, por seu pai,
Inaldo Soares. O jovem Cavendish vivia no Rio, onde, de 1986 a 1990, estudou
engenharia civil nas Faculdades Integradas (hoje Universidade) Veiga de Almeida.
Festeiro e boa-pinta, aproveitou a juventude na noite carioca, mas, após
formado, assumiu, aos 27 anos, o Conselho de Administração da Delta, em 1.º de
dezembro de 1990. Em 1995, transferiu a matriz para o Rio - sempre que pode,
demonstra a paixão pelo Estado. 'Gosto de praia', diz o empresário, que esbanja
informalidade e sorrisos. Ele completará 49 anos em 17 de junho.
Garotinho. Uma cartada de Cavendish decisiva para turbinar a
Delta foi a aproximação, no fim dos anos 1990, de Garotinho, então uma novidade.
Em parceria com outra empreiteira, a Oriente Construção Civil, a Delta ganhou a
concessão da estrada RJ-116, de Itaboraí a Macuco, no interior. Foi o Edital
001/99 do Departamento de Estradas de Rodagem do governo que começava. A via tem
quatro postos de pedágio a preços que atualmente vão de R$ 3,90 a R$ 15,60,
dependendo do tamanho do veículo, e é explorada desde então pelas duas
empreiteiras.
A aproximação Cavendish-gestão Garotinho logo no início do
governo ajudou o dono da Delta na disputa com empreiteiras maiores, que passaram
a ver com reservas a impetuosidade do jovem. Por vezes, o empreiteiro fixou
preços supostamente abaixo do mercado, irritando concorrentes. Mais adiante, a
empresa tocou obras grandes da Prefeitura do Rio sob o comando de Cesar Maia
(DEM), adversário de Garotinho. 'Os concorrentes reclamavam que a Delta entrava
com preços inviáveis. Mas a empresa sempre entregou as obras a tempo e com o
preço contratado', diz Maia.
Durante a gestão de Maia, de 2002 a 2008, o município
contratou, em valores não corrigidos, R$ 331.059.602,42 em obras e serviços da
Delta. Hoje, porém, Cavendish já não é mais visto, entre as grandes
empreiteiras, como forasteiro. E no governo do sucessor de Maia, Eduardo Paes
(PMDB), em valores não corrigidos, fechou contratos de R$ 325.534.422,51.
A primeira eleição de Cabral para governador, em 2006, ocorreu
com apoio de Garotinho e de sua mulher e sucessora Rosinha. Cabral foi reeleito
em 2010, mas rompido com o casal desde 2007. O fato não afetou a posição da
Delta, que ganhou no peemedebista um aliado que facilitou seu acesso ao governo
federal. A proximidade com o vice-governador (e ex-secretário de Rosinha), Luiz
Fernando Pezão, também foi um fator que ajudou a cacifá-la. Com o crescimento do
PAC, a empresa expandiu-se nacionalmente. De 2007 até hoje, as obras contratadas
com a Delta pelo Estado do Rio somaram R$ 1,49 bilhão. Entre os trabalhos de
maior visibilidade, estão a nova pista do Aeroporto de Cabo Frio e a
reurbanização do Complexo do Alemão. Sobre a reforma do Maracanã, que a Delta em
consórcio com a Odebrecht e a Andrade Gutierrez, a empresa decidiu anteontem que
deixará a obra após deixar de fazer dois repasses financeiros ao consórcio - já
como consequência das denúncias de envolvimento com Cachoeira.
Festas e amizade. O lado extrovertido do empresário ficou
evidente em 12 de novembro de 2009, em seu casamento com Jordana Kfuri, o
segundo de sua vida. A festa foi na casa do empresário em Itaipava, em
Petrópolis. Cerca de 700 convidados assistiram a uma celebração nos jardins, com
uma passarela protegida por toldos transparentes e iluminada por velas e
decorada com castiçais de prata, 'gotas' de cristal e rosas brancas.
O casamento, que gerou filhas gêmeas, foi tragicamente
encerrado em 17 de junho de 2011, quando Jordana e mais seis pessoas morreram em
acidente de helicóptero na Bahia, a caminho da festa de aniversário de
Cavendish. Cabral já tinha chegado, mas, como o empresário, não embarcou no
aparelho, que estava lotado. A amizade entre o dono da Delta e Cabral começara
por intermédio da mulher de Cabral, Adriana Ancelmo, e Gabriela Carvalho,
primeira esposa do empreiteiro.
Aliados de Cabral confirmam que a ligação de ambos é forte.
São parecidos: simpáticos, extrovertidos, carismáticos, vaidosos, metidos a
galanteadores, bonachões. Mais do que os negócios entre a Delta e o Estado, a
relação de amizade se baseia em empatia, descrevem. Um aliado do governador diz
que eles se encontram para 'beber e falar besteira'. A revelação de que a Delta
estaria fazendo negócios com o Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira,
porém, teria incomodado Cabral.
Outro interlocutor do governador conta que o peemedebista tem
se lamentado e dito que Cavendish teria passado dos limites. O mesmo amigo de
Cabral, contudo, afirma que a postura pode ser uma tentativa do político de se
afastar do empreiteiro 'para tentar não se queimar'.
Na quinta-feira, porém, Pezão disse que os contratos com a
Delta 'obedeceram a todos os editais' e afirmou que a empresa é 'agressiva, por
isso tem mais contratos'. O governador e o empresário têm casas de veraneio no
mesmo condomínio em Mangaratiba, no sul fluminense. Até o acidente de
helicóptero no litoral baiano, tornando pública a proximidade dos dois, eles
costumavam passar fins de semana juntos com suas famílias. Cavendish, Cabral e
suas mulheres já tinham dividido o jatinho Legacy emprestado por Eike Batista
para pelo menos mais uma viagem: uma semana em Nassau, capital das Bahamas.
O Ministério Público Estadual investigou a relação do
governador com os empresários e considerou não haver irregularidades: o
procurador-geral de Justiça do Rio, Claudio Lopes, arquivou o procedimento.
No Rio, as boas relações de Cavendish não se limitam ao
governador. Ele também é amigo de deputados federais, como Eduardo Cunha e
Washington Reis, ambos do PMDB, e tem bom trânsito no Tribunal de Justiça, do
qual recebeu R$ 154 milhões por obras. Além disso, a Delta
Fonte: Estadão
Fonte: Estadão
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