segunda-feira, 5 de setembro de 2011

OS MALES DA CARREIRA ADOECEM 18 MIL PROFESSORES EM MINAS.

Por Cláudia Giúza - Jornal O Tempo online 05/09/2011.

A agressão e as ameaças de morte feitas por um aluno de 15 anos à diretora de seu colégio trazem à tona a falta de segurança e a fragilidade do sistema de ensino brasileiro. O caso aconteceu recentemente em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, mas retrata a realidade de grande parte dos profissionais da educação no país. A tensão no ambiente de trabalho é um dos motivos que adoecem os professores e, muitas vezes, os forçam a deixar a sala de aula. Em Minas, dos 183.296 professores estaduais, 8.859 foram transferidos para outras funções e 9.017 aguardam perícia médica - são 17.876 docentes afetados. A situação se repete na capital, onde 786 dos 10.499 servidores deixaram as salas de aula.

Maria*, 54, deu aulas de biologia por 23 anos em João Monlevade, na região Central, mas parou de lecionar por problemas de saúde. "Perdi a minha voz completamente e tive depressão. Não aceitava a minha incapacidade de fazer o que sempre amei", conta. Além dos problemas físicos, ela diz que a readaptação também trouxe danos psicológicos. "Me jogaram em uma biblioteca empoeirada e mofada. Antes, tinha um problema de voz e, agora, me sinto emocionalmente incapaz de desenvolver qualquer tipo de trabalho na escola", explica.

Depressão. A depressão não atingiu apenas Maria. A doença é uma das principais reclamações dos professores e é causada por diversos fatores, como a falta de estrutura e desentendimentos com pais e alunos. Foi assim com a professora de inglês Carolina*, de Diamantina, no Alto Jequitinhonha. Além do cansaço da rotina de aulas em duas cidades diferentes, a frustração da falta de estrutura para trabalhar lhe rendeu uma depressão e a síndrome do pânico. "A readaptação só piorou meus problemas de saúde. Somos excluídos até mesmo pelos colegas de profissão".

No caso de Marta*, 32, professora de história, a indisciplina e a política educacional foram os problemas. Há seis anos afastada, ela conta que tudo começou quando percebeu o baixo desenvolvimento dos alunos. "Comecei a ficar angustiada e recebi o diagnóstico. É triste perceber que seu aluno não sabe nem escrever direito devido à política que impede a reprovação. Isso acabou gerando muita indisciplina e a situação está incontrolável", conta.

Retaliação. Um professor da região metropolitana da capital, que pediu para não ter o nome divulgado, conta que além da tristeza de deixar a sala de aula, os profissionais sofrem também pressão de seus superiores e até cortes salariais. No seu caso, a perseguição veio por parte da diretora da escola. "Eles não me falam nada e me colocam para fazer todo tipo de serviço. Já cheguei a repor papel higiênico nos banheiros. É muita humilhação". Ele ainda perdeu 20% do salário no chamado "pó de giz" e 5% de biênio, incentivos pagos apenas a professores que estão em sala de aula.

A mestre pela Universidade Braz Cubas, em São Paulo, Maria de Lourdes de Moraes Pezzuole desenvolveu uma tese sobre o assunto e confirmou que a depressão é muito comum entre os readaptados. Junto com ela estão problemas na voz e na coluna. A especialista afirma que, em boa parte dos casos, o problema poderia ser minimizado, o que não acontece porque é comum não haver qualquer acompanhamento médico e psicológico do profissional.

Maria de Lourdes é professora de educação física e também foi afastada. Após dois anos de tratamento, ela voltou para a escola, mas em outra função. No início do ano, após uma decisão judicial, ela conseguiu retornar à sala de aula. "Só estou dando aula porque o Estado teria que me pagar R$ 500 por dia fora de sala", conta.


Cansaço físico e mental atinge 93% dos profissionais da rede particular
Os professores da rede particular de Minas também são afetados por problemas relacionados à profissão. Uma pesquisa do Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro Minas), em parceria com o Ministério do Trabalho, mostrou que, em 2009, 92,84% dos educadores reclamavam de cansaço físico e mental.
Também conforme o estudo, 82,58% da categoria afirmou que a exigência do cumprimento de prazos é o principal motivo para tornar o ambiente institucional ameaçador. Já a principal causa de desgaste, segundo 40, 25% dos entrevistados, é a relação aluno/professor.
O sociólogo e pesquisador em educação Rudá Ricci não se assusta com o resultado e diz que a educação no Brasil está doente. Ele afirma que faltam políticas de incentivo à docência e que os governantes se omitem diante dos problemas.
Ele aponta ainda outro problema: a pressão dos pais. "Os pais estão cada vez mais ausentes na criação de seus filhos. Eles pressionam psicologicamente os professores impondo que os profissionais supram a atenção e os limites que eles não conseguem colocar em casa", afirma Rudá Ricci. (CG)


* Os nomes dos entrevistados foram alterados para preservar suas identidades.

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