Embora o autor não tenha analisado os problemas que envolvem as baixas avaliações como falta de maior investimento público; desestrutura familiar causada pelos problemas sociais que as famílias vivenciam; uma mídia deseducadora; pouco tempo de permanência dos alunos na escola; educadores desvalorizados e um projeto educacional voltado para um mercado de trabalho ( no qual a maioria dos alunos não se enxergam nele), em detrimento da valorização do conhecimento universal como elemento formador da nossa humanidade, o artigo abaixo está bem interessante porque colabora para desvelar a concepção de neutralidade dos instrumentos de avalição externas adotados pelo modelo educacional vigente.
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Todas as vezes que surgem novos dados
relativos a processos de medição da qualidade do ensino, ocorre o mesmo
frenesi, numa mistura de espantos, busca de culpados e casos exemplares a
serem imitados.
Não há dúvida de que ter acesso a
informações pode contribuir para a compreensão do que ocorre com nossa
educação, mas é fundamental esclarecer algumas limitações advindas tanto
dos dados quanto das suas interpretações.
Instrumentos como Ideb, Enem, Prova
Brasil, Pisa e outros são tratados frequentemente como se fossem
oráculos através dos quais enxergaríamos "a" realidade. Eles se postam
num pedestal (ou são postados?), pretensamente neutro, em que a verdade
seria retratada. Essas ferramentas de viés avaliativo são parciais e
buscam demonstrar recortes ancorados em determinados valores e
concepções do que seja "qualidade".
O Ideb é a bola da vez, e convido-o a
algumas reflexões. O que você diria da qualidade do ensino de uma escola
que não consegue ensinar biologia, história e inglês aos seus alunos? E
ela também é péssima em física e educação artística... Segundo a
medição do Ideb, tudo isso seria indiferente, e a nota da escola até
poderia ser alta, pois somente são aferidas informações relativas a
português e matemática. Em contraste, o que você pensaria de uma escola
com resultados excelentes no ensino de química, geografia e educação
física? Nesta escola haveria também ótimos trabalhos em relação à
sexualidade, às drogas, e o bullying seria coisa do passado. Você diria
que ela é inadequada só porque não está entre os melhores Idebs do
Estado? Há "qualidades" ignoradas pelo Ideb.
Outra opção sedimentada de leitura tende
a focar o olhar predominantemente sobre as mazelas das escolas
públicas, quando os dados indicam também visões alternativas. Por
exemplo, as melhores escolas do Brasil são públicas! Sim, a começar
pelas federais. Mas não só estas: entre as 10 melhores escolas gaúchas
no Ideb dos anos iniciais do Ensino Fundamental figuram apenas
instituições estaduais e municipais. A nota média das escolas privadas
gaúchas (6,7) está abaixo da pontuação das 10 melhores escolas públicas
do Estado (entre 7,3 e 8,2). E, se a nota média privada é 6,7, pode-se
afirmar que boa parte delas tem notas abaixo desse patamar, com 6 ou 5
pontos. Para quem acredita na lógica concorrencial, o que dizer do fato
de as escolas privadas gaúchas terem desempenho pior do que suas
congêneres catarinenses e paranaenses, em todas as séries avaliadas,
tanto em português quanto em matemática? Há indícios de que pagar
mensalidades escolares não garante aos gaúchos uma boa posição em tempos
de vestibulares nacionais.
Três leituras: 1) o Ideb não tem nada de
neutro e expressa uma visão limitada de qualidade; 2) a ladainha de que
o poder público é ineficiente não é uma verdade inabalável; 3) as
escolas privadas não são a maravilha que alguns creem.
*Professor da Faculdade de Educação da UFRGS
Fonte: Zero Hora
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