Em 2014 está prevista a realização da Copa do Mundo no Brasil. Bilhões de reais estão sendo investidos para a construção e reforma de estádios, de viadutos, rodovias, reformas em aeroportos, investimentos, enfim, na rede hoteleira e toda a infra-estrutura necessária para que se realize esta festa mundialmente esperada, que tem a duração de alguns dias, apenas.
A exploração política eleitoreira do evento obviamente está no cardápio de praticamente todos os partidos e governos. Já se falou que os gastos com a Copa ultrapassarão a casa dos R$ 100 bilhões, pelo menos, o que não duvido.
Contudo, o que a grande (em negociatas, não em jornalismo) mídia não mostra para o público brasileiro, e muito menos para os povos de outros países, é que, neste mesmo Brasil da Copa de 2014, os governantes dos estados, incluindo Minas Gerais, recusam-se a pagar um miserável piso salarial de R$ 1.187,00 para os educadores.
Trata-se de uma verdadeira agressão aos destinos dos brasileiros e brasileiras, especialmente aos milhões de estudantes filhos de trabalhadores de baixa renda, que dependem do ensino público como única porta de saída da realidade do crime organizado ou da falta de perspectiva e exclusão social imposta pela dinâmica da reprodução do capital.
Os mesmos governos de estado - como o de Minas Gerais - e o governo federal, que investem bilhões em obras faraônicas, têm a cara de pau de dizerem que não possuem recursos em caixa para pagar o piso salarial, que é assegurado pela lei federal 11.738, aprovada em 2008 e considerada constitucional pelo STF em 2011.
A opção prioritária destes governos por eventos midiáticos espetaculosos se choca com a realidade dramática vivida pelos profissionais da educação nos estados e municípios do país, que recebem os piores salários do mercado de trabalho, e sobre cujos ombros são colocadas atribuições de peso, entre as quais a de contribuir com a formação humana e profissional de milhões de crianças, jovens e adultos.
Não é por acaso que cada vez um número menor de estudantes opta pelos cursos de licenciatura; também não é por acaso que a qualidade do ensino público deixa a desejar, dada à sobrecarga de trabalho dos profissionais, que labutam em dois ou três cargos para sobreviverem, e não contam com políticas sérias de formação continuada por parte das redes de ensino; além das contratações de pessoas não habilitadas para atuarem na docência.
A recusa dos governos em pagarem o piso salarial, que é lei federal - e que define as fontes de financiamento e os meios compartilhados entre os entes federados para sua implementação -, conseguiu reunir os diversos partidos políticos que gerenciam a máquina do estado. Do PT no Governo Federal ou no estado do Rio Grande do Sul, passando pelo PMDB do governo de Maranhão e do Rio de Janeiro, pelo PSB do governo do Ceará, pelo DEMO do governo do Rio Grande do Norte e de Santa Catarina, ou pelo PSDB do governo do Pará ou de Minas Gerais - estado que vergonhosamente paga o pior piso do país - R$ 369,00 -, todos, sem exceção, uniram-se nesta santa aliança contra os educadores do ensino básico.
Durante o ano de 2011 o Brasil assistiu à deflagração de greves em praticamente todos os estados da Federação, com a exigência comum, pelos educadores, de que fosse cumprida uma lei federal em vigor, a Lei do Piso. A greve que teve a maior duração foi a de Minas Gerais, com 112 dias de paralisação, que foi também a maior greve da história dos educadores do estado.
O atual governador de Minas, um professor, segundo consta do biografia do mesmo, se não mudar a sua forma de relacionamento com os profissionais da Educação, pode entrar para a história como o pior carrasco que os educadores já conheceram em várias décadas. E olha que os educadores mineiros já enfrentaram desgovernos de todo tipo: de Newton Cardoso a Eduardo Azeredo, passando por Hélio Garcia, Itamar Franco, Tancredo Neves e seu neto, o faraó, todos eles com claro desprezo pelos servidores em geral, mas especialmente pelos trabalhadores em educação.
Mas, chama-nos a atenção para este dado relevante da nossa realidade: enquanto se investe bilhões em obras faraônicas e pagamento de juros para banqueiros que não têm onde guardar tanta fortuna, nega-se, aos educadores, um direito constitucional, o de receberem um piso salarial nos respectivos planos de carreira e tabelas salariais.
Por toda parte a desculpa é a mesma: os governos alegam não terem recursos para pagar o miserável piso salarial dos educadores. Ainda têm a cara de pau de aparecerem na TV dizendo que os educadores estão pedindo valores absurdos, quando estamos falando de um piso de R$ 1.187,00 para um jornada de até 40 horas. E o mais grave é que a Lei do Piso assegura, aos que provarem não ter dinheiro em caixa, que lancem mão de ajuda do governo federal.
Assim, os governantes dizem não possuírem recursos, mas não provam isso de papel passado, talvez porque estejam fazendo mau uso dos recursos da Educação. Por sua vez, o governo federal, que deveria complementar os recursos dos estados e municípios que comprovarem não poder pagar o piso, nada faz, num ato de omissão e cumplicidade com estes governos. O compadrio funciona, assim, ao estilo da política dos coronéis dos tempos da República Velha: eles não nos pedem nada, porque usam mal o dinheiro público; e nós podemos dizer que estamos prontos para ajudá-los, desde que provem que realmente precisam. Quem são as vítimas deste acordão implícito que envolve a conivência dos procuradores regionais, dos legislativos e dos judiciários? Obviamente, os educadores e os estudantes.
Contudo, quando se trata das obras para a Copa do Mundo, o comportamento do governo federal foi bem diferente. A presidenta Dilma fez questão de visitar as obras da reforma do estádio do Mineirão - onde aliás acontecia uma greve dos operários. No mesmo período em que esteve aqui, estávamos em greve, na nossa heroica greve dos 112 dias. Infelizmente, tal como o governador-professor de Minas, a presidenta não demonstrou o mesmo zelo pelo ensino público que tivera em relação às obras faraônicas, que servirão para o espetáculo midiático de alguns dias apenas, em meados de 2014.
A principal obra social, que é a formação humana, crítica, proporcionada pelo incansável trabalho diário de milhares de educadores que recebem salários de fome, esta obra não interessou nem à presidenta, e muito menos aos governadores dos estados, especialmente ao governador-professor de Minas e seu padrinho político, um total omisso em relação ao drama vivido em Minas pelos educadores, como legado do governo dele.
É este o cenário fantasioso e espetaculoso montado pelas elites políticas brasileiras, financiadas por uma trupe de grandes empresários, que fatiam entre si as receitas do orçamento público - este mesmo, que nunca sobra para remunerar condignamente os professores e demais educadores.
O que os profissionais da Educação de Minas pedem desde o ano passado é o cumprimento de uma lei federal - a Lei do Piso. Esta luta, em 2010, resultou numa greve de 47 dias; em 2011, outra, de 112 dias, além das mobilizações que estão previstas, como o boicote ao SIMAVE, a redução de jornada entre os dias 16 e 18 e a paralisação no dia 22. Seguramente em 2012, caso o governo insista em não pagar o piso e em destruir a carreira dos educadores, nova greve será deflagrada - e desta feita com maior organização e apoio da comunidade, que já está ciente do descaso e descaramento do atual governo para com os trabalhadores, que estão em contato diário com milhões de alunos e pais de alunos.
Até o momento, já neste final de 2011, o país sede da Copa do Mundo versão 2014 continua sendo aquele cujos governantes, que gastam bilhões em obras faraônicas e em publicidade, são os mesmos que se recusam a cumprir uma lei federal, sonegando aos educadores um miserável piso salarial nacional.
Que o chão de Minas e do Brasil continue tremendo, até o pagamento do piso nas nossas carreiras e a devolução de cada centavo que foi garfado dos educadores em 2011
Texto extraído do blog do professor Euler Conrado.
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